Simpósio: ITV no Horizonte 2025 – Uma visão prospectiva

ITV portuguesa com futuro de ouro

A previsão mais otimista, e aquela em que a ATP mais acredita, prevê a continuação do crescimento da indústria têxtil e vestuário até 2025, impulsionada pela automatização, qualificação dos recursos humanos e aposta na criatividade e na sustentabilidade credível. O cenário foi traçado ontem, no Fórum da Indústria Têxtil.

Depois das melhores perspetivas para 2020 terem sido ultrapassadas antes do prazo previsto, o novo Plano Estratégico da ATP – Associação Têxtil e Vestuário de Portugal para o sector antevê, no cenário de ouro, que em 2025 a indústria têxtil e vestuário mantenha mais de 4.000 empresas, um volume de negócios de 8 mil milhões de euros, atinja 6 mil milhões de euros de exportações, uma balança comercial superior a mil milhões de euros e mais de 110 mil trabalhadores diretos.

«O objetivo para 2025 é posicionar a ITV portuguesa como uma indústria inovadora, credivelmente sustentável, passar de follower a trendsetter e ser líder mundial em produtos de design e performance em alta gama», explicou Paulo Vaz, diretor-geral da ATP, afirmando que o caminho deverá passar por um maior foco nos serviços da indústria, digitalização, diversificação de mercados e clientes e proximidade ao cliente final.

Ao Portugal Têxtil, Mário Jorge Machado, presidente da ATP, esclareceu que «dois terços dos trabalhadores da indústria já têm mais de 40 anos. Por isso, ao longo das próximas décadas vamos ter um problema complexo, porque vamos perder muita mão de obra por questões demográficas mas também por causa da competitividade entre os sectores», o que explica, juntamente com uma maior automatização de processos, a eventual diminuição do número de postos de trabalho diretos.

Nos últimos 10 anos, entre 2009 e 2018, revelou Ana Paula Dinis, responsável pelo departamento de relações internacionais da ATP, o volume de negócios da indústria têxtil e vestuário cresceu 45% e as exportações subiram 52%. Este ano, contudo, os números mostram-se menos positivos, nomeadamente no comércio externo. «Nos meses conhecidos, até setembro, temos uma queda de cerca de 1%», indicou. Contudo, destacou, «estamos a comparar com um período muito bom», já que 2018 foi um ano recorde. «Em comparação com 2017, os números deste ano ainda são positivos», asseverou Ana Paula Dinis.

Para chegar ao melhor cenário idealizado pela ATP que, segundo assegurou Mário Jorge Machado ao Portugal Têxtil, «é o que nos parece mais provável », a indústria terá de se adaptar às mudanças estruturais do negócio da moda, expressas em cinco tendências que, por sua vez, vão gerar cinco motores do desenvolvimento: conhecimento e capacitação, design, tecnologia, internacionalização e, pela primeira vez, a sustentabilidade.

As vantagens…

Nesta última área, Portugal está em vantagem, garantiu Mike Mikkelborg, coproprietário da NA-KD e cofundador da Pilot Digital. «O facto do mercado estar a mudar e a movimentar-se tão rapidamente é uma enorme oportunidade. É uma oportunidade para quem está disposto a correr o risco e a procurar novas formas de trabalhar. E acredito há três coisas [sustentabilidade, speed-to-market e utilização de dados] que estão a mudar a indústria e que Portugal pode aproveitá-las», afiançou.

«Portugal está perfeitamente posicionado para dizer “estamos aqui, podemos dar o que precisam. Podemos olhar para os dados, podemos reagir mais rápido do que os outros, já não somos tão caros quanto isso se nos ajudarem a ser produtivos. E, mais importante, acreditamos na sustentabilidade e estamos realmente a investir nisso”», realçou Mikkelborg. Para João Almeida, administrador da JF Almeida, que interveio no debate que juntou ainda Fernando Mascarenhas, sócio da KPMG Advisory José Manuel Castro, diretor-geral do Modatex, João Cerejeira, professor e investigador na Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho, e Lurdes Brandão Guerra, business developer na SGS, «temos de ser inovadores, criativos e credivelmente sustentáveis», uma afirmação corroborada por Lurdes Brandão Guerra. «Cada vez mais, as organizações têm de incorporar a responsabilidade social e a componente ambiental de forma credível – não podemos usar um sistema de greenwashing, não podemos dizer que somos verdes quando somos mais negros que esta carpete», referiu.

… e os desafios

Neste universo competitivo, a indústria portuguesa tem também a vantagem da flexibilidade e da agilidade das suas empresas, como apontou Fernando Mascarenhas, enquanto na formação há ainda muito trabalho a fazer, reconheceu José Manuel Castro. O ensino, explicou o diretor-geral do Modatex, «está encapsulado em lógicas de muros de escola» e a formação para profissões da indústria têxtil é ainda malvista. «Qualquer jovem que, antes dos 18 anos, decida escolher um curso de formação técnica no sector têxtil, é visto com preocupação pela família», mencionou, apelando, por isso, a um esforço, incluindo, governamental para haver «um contexto amigável para a formação profissional».

Neste momento, segundo os dados apresentados por João Cerejeira, apenas 30% da mão de obra da indústria têxtil e vestuário concluiu o ensino secundário, que é atualmente a escolaridade mínima e, com apenas um terço dos trabalhadores com menos de 40 anos, «há um problema de renovação geracional do sector», que se irá agravar com a perda demográfica antecipada pelo INE, que «estará concentrada na região Norte», precisamente onde está também concentrada esta indústria.

O recente aumento do salário mínimo será igualmente um desafio, confirmou o professor e investigador da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho, sobretudo para as empresas mais pequenas do sector, onde a remuneração mínima é predominante; 70% nas empresas até cinco trabalhadores; 66% nas com cinco a nove trabalhadores; e 63% para as que têm entre 10 e 49 trabalhadores. «É um acréscimo muito significativo dos salários para as microempresas», sublinhou João Cerejeira.

Já Pedro Braz Teixeira, diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, enumerou algumas tendências que vão marcar a economia e, consequentemente, a indústria têxtil e vestuário portuguesa, desde o fraco crescimento económico de Portugal face a outros países europeus, nomeadamente de Leste, à necessidade de apostar seriamente na formação e atrair investimento direto estrangeiro. «Precisamos de aumentar a dimensão das empresas portuguesas», exemplificou, adiantando que, «se tivéssemos a mesma estrutura de dimensão de empresas da média europeia, o nosso PIB era 15% superior». Pedro Braz Teixeira deixou ainda «um apelo à ATP para que seja o mais vocal possível e exija reformas, medidas e mudanças».

Governo quer acompanhar o sector

Um apelo a que Mário Jorge Machado tinha já respondido no início da sessão, com o habitual discurso do sector, onde, frente ao Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, Pedro Siza Vieira, pediu a «criação de um entorno amigo das empresas transformadoras», solicitando reformas em áreas como o acesso ao financiamento, os custos da energia e ambientais, a legislação laboral e a política fiscal.

Um discurso que Pedro Siza Vieira classificou de «ambicioso» e «realista», por não «ignorar as dificuldades que o sector enfrenta», ao mesmo tempo que garantia que «o Estado vai acompanhar as exigências do sector. E estamos conscientes das áreas que têm de ser acompanhadas». Na área do financiamento, o Ministro destacou que «queremos que as instituições financeiras do Ministério da Economia possam ter um papel mais assertivo» e anunciou que «nos próximos tempos vamos também lançar um conjunto de avisos dirigidos ao sector, ao abrigo do Portugal 2020 para apoiar a internacionalização».

Fonte: Portugal Têxtil – 5 de dezembro de 2019

06/12/2019 , Por Cátia Silva Pinto
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