Insetos de África do Sul vão controlar planta invasora
Pela primeira vez em Portugal, milhares de insetos, trazidos da África do Sul, vão ser libertados, entre outubro e dezembro deste ano, na costa portuguesa, para ajudar a controlar praga vegetal.
É uma das "piores plantas invasoras" no país:a acácia-de-espigas. Este arbusto, ou pequena árvore australiana, "tem pólen alergénico, ameaça a biodiversidade nativa, altera o solo e a dinâmica do sistema dunar, diminui a produtividade em áreas florestais e acarreta custos elevados para o seu controlo", explica ao DN Elizabete Marchante, investigadora da Universidade de Coimbra (UC). A solução chegou por via de um inseto da África do Sul, que investigadores de Coimbra estudaram durante 12 anos, para se assegurarem de que a estratégia é segura.
Numa primeira fase, os insetos (Trichilogaster acaciaelongifoliae) serão libertados numa extensão entre Quiaios, na Figueira da Foz, Mira e S. Jacinto, em Aveiro, "para impedir a formação de sementes da acácia-de-espigas", adiantou ao DN a investigadora da equipa do Centro de Ecologia Funcional (CEF) da UC, coordenado por Helena Freitas, no âmbito do projeto que também junta especialistas da Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Coimbra (IPC). Já no próximo ano, esta metodologia deverá abranger outras áreas do país e assim sucessivamente, no âmbito deste projeto que deverá durar anos.
A autorização para a libertação do primeiro agente de controlo natural para conter a dispersão desta planta invasora, e o terceiro na Europa, chegou recentemente. "É um passo de gigante numa Europa muito conservadora em relação ao controlo natural de plantas invasoras. É um importante contributo e abre portas para a utilização desta tecnologia, no futuro, para o controlo de outras espécies de plantas invasoras", disse.
Estas plantas, com oito a dez metros de altura, considerados "um grave problema", dominam uma extensão de quilómetros ao longo da costa portuguesa, impedindo, nomeadamente, a proliferação de uma diversidade de outras espécies de plantas. Também são alergénicas.
Mas, afinal, como é que tudo se vai processar? Os investigadores vão receber milhares de insetos, em outubro próximo, diretamente de África do Sul, país que introduziu a mesma metodologia, "em 1982, com uma taxa de sucesso e onde, hoje, as plantas já não são um problema", contou Elizabete Marchante. A investigadora espera, assim, "ajudar a controlar a proliferação da acácia-de-espigas, conter e diminuir a sua dispersão, além de, aos poucos, diminuir as plantas espalhadas pelo País, sobretudo nas dunas e pinhais do litoral".
O processo é tão simples quanto isto: os investigadores vão selecionar apenas as fémeas saudáveis que serão largadas nas plantas. Posto isto, vão libertar os insetos que "promovem a formação de galhas - também conhecidas como bugalhos - nas gemas florais da acácia-de-espigas". Segundo a especialista, "quando as galhas se formam, as flores e consequentemente os frutos, e depois as sementes da planta invasora não se chegam a formar".
Em termos práticos, a planta não é erradicada no país, o que pode ainda demorar muitos anos. Mas, consegue-se "diminuir a capacidade de invasão e de dispersão das sementes no solo" que têm nas cinzas dos fogos e nas altas temperaturas os melhores amigos para se desenvolverem. Segundo Elizabete Marchante, as acácia-de-espigas são proibidas por lei e as pessoas deveriam cortá-las.
Mas até aos investigadores chegarem aqui foram precisos 12 anos de estudos, avaliações de risco e pedidos de autorização, passando o crivo de autoridades nacionais e europeias. Até à data, o projeto contou com o apoio da Fundação para a Ciência e Tecnologia e do Fundo Comunitário Europeu (FEDER). Depois de dezembro, a equipa vai candidatar o projeto a novos fundos para poder fazer o acompanhamento da introdução dos insetos durante os próximos anos.
A título de curiosidade, esta planta australiana foi trazida nos finais do século XIX, inícios do século XX, para segurar as areias nas dunas e também foi plantada nos pinhais litorais e nos solos não arenosos.
Fonte: Diário de Notícias